Finalmente tudo terminado. A mesa estava artisticamente decorada, com verdadeiras obras de arte. Os doces dispostos numa outra mesa à parte chamavam atenção pela cores e pelas texturas: convidavam o olhar a saciar-se mesmo antes de o paladar poder ser satisfeito.
Os arranjos florais, a louça disposta em combinações atractivas, a fruta a desenhar esculturas multicolores e suculentas; tudo nos seus devidos lugares.
Dedicação e empenho: horas de combinações possíveis para um resultado perfeito, tentado iludir os sentidos, transformando o propósito final numa sincronizada mistura de prazeres para a vista, com a finalidade de aguçar o paladar.
De pé, a uma distância segura, olhava o seu trabalho - o fruto do seu esforço à frente de uma equipa que se mostrou dedicada e empenhada - o resultado final estava à vista.
Enquanto se inebriava , suspenso no orgulho, um ponto preto chamou-lhe a atenção. Numa rápida passagem, em jeito de provocação, o minúsculo alado ponto negro desenhou um circulo em frente aos seus olhos e continuou o movimento em direcção à sua obra prima.
O terror trespassou-lhe as entranhas: uma mosca. Uma pequena e ignóbil mosca, que com as suas patinhas conspurcadas poderia deitar a perder horas e horas investidas na busca da perfeição.
O pensamento correu numa desenfreada busca da solução rápida e eficaz. Sem prever consequências, seguiu o perturbante e voador ponto preto.
No seu passeio aparentemente inofensivo, a mosca pousou - em jeito de prova gourmet - na estátua do anjo em gelo.
O pano branco - num gesto mecânico, irreflectido - esbarrou com toda a gana de agressividade. contra a minúscula (não) convidada para o banquete.
O anjo, na sua cristalina delicadeza - não suficientemente robusta para o peso do pano, que adejou simulando um projéctil incendiário - resvalou na escorregadia liquidez da fragilidade.
No chão, multiplicado em mil pedaços de uma cortante desilusão, o anjo jazia.
A minúscula mosca, aturdida pela velocidade dos movimentos levantou voou, e ignorante da sua condição de forasteira não querida, continuou os voos exploratórios.
A raiva cresceu e com ela a diminuta avaliação de riscos e consequências. Em poucos minutos, toda a quantidade de horas gastas na produção de tanta beleza, caíram por terra, desfeitas em cacos, ou despedaçadas em heterogéneos restolhos de diversas texturas, já pouco apetecíveis.
Atónita a equipa assistia ao desintegrar do cenário, transformado em palco de uma guerra persecutória do mestre ao quase imperceptível alado ponto negro.
Em poucos minutos a destruição era total; o mestre possuído por uma passageira mas fatal loucura, continuava bramindo o pano branco como se um sabre se tratasse, e a mosca voava e pousava aleatoriamente fustigada pela perseguição.
Perdido, tudo perdido. Caindo em si o mestre percebeu o desajuste dos meios. Era tarde; a mosca continuou o seu voo e perdeu-se, por a fresta duma janela.
Só o cenário se mantinha: os despojos; relembrando o orgulho perdido e a inutilidade da raiva.
Pontos pequenos e insignificantes não devem ser entendidos por nós como ameaças. Ameaça é tudo o que destrói o verdadeiramente importante; verdadeiramente importante é tudo aquilo que nos mantém.
Quando o sonho existe e é transposto para a realidade à que saber defende-lo.
Não devemos atacar nada, nem ninguém sem saber se realmente é uma fonte de problemas, não nos devemos preocupar desnecessariamente em função de algo que não sabemos se vai acontecer, para evitar que realmente aconteça.
Não devemos utilizar meios desnecessários para não destruir o que já se construiu, e sobretudo, manter a calma. Para que uma simples mosca passageira, não destruam o produto do sonho, fruto de muita dedicação, é necessário saber aguentar a pressão da sua presença e deixá-la voar para um novo poiso.
Vim aqui ter pelos comentários que deixas na Raquel.
ResponderEliminarPor curiosidade sim. E porque a Raquel é uma boa aferição:)
Não vou já dizer que escreves muito bem e de forma original e blablabla...
E...amei:)
Pra já vou me limitar. E ler-te. Depois veremos.
Beijinhos M., obrigada pelo carinho.
ResponderEliminarFico à tua espera aqui :)
Uma mosca não é problema, até podemos fingir que não a vemos, duas moscas não incomodam... mas quando há moscas-varejeiras por todo o lado, não há nada que lhes resista, seus ovos vão contaminando e apodrecendo tudo... não esquecendo o grande final... o eclodir das larvas esfomeadas ;)
ResponderEliminarBjos
moscas...afff...são chatas demais.
ResponderEliminarNão seriam elas os nossos maiores problemas...grande beijo de bom sabado pra ti qeurdia.
ResponderEliminarse me perguntares como vim visitar-te, respondo-te que não sei e que é um mero acaso.
ResponderEliminartalvez o facto de andar a comentar os amigos e permitir-me ler outros comentários, que é raro em mim, acabando por ler um dos teus, que me abriu a porta da curiosidade.
não me dou por arrependido pois, encontro um hábil "monumento" de palavras, que me intrigam com a sua conjugação, revolucionando a importância de uma simples mosca, que detesto, mas que aqui, neste teu espaço, fiquei a considerá-la como, enorme, fonte de inspiração para um agradável momento de leitura.
parabéns
Antes de conhecer a M , conheci a Lou . Uma Lou esquizofrenica que nos encontramos num blogue. Depois de esquizofrenica passou a Alma.
ResponderEliminarDepois desapareceu ....muito tempo e eu senti a falta da Lou Esquizofrenica e da Lou Alma...nunca mais a vi!
Entretanto surgiu a M ,não sei como , mas lembro-me de ter perguntado "posso entrar"? . Eu deixei e nunca mais saiu . Que bom!
Eu tinha a M e não tinha a Lou , mas quando lia a M , por vezes lembrava-me da Lou (acho que é a sensibilidade associada a uma perspicácia, sei lá ...faltam-me as palavras)
Mais tarde,reaparece a Lou e a M ainda lá estava, pensei: "gosto de ambas, têm algo em comum , não sei bem o que , mas gosto de ambas , agora encontram-se que bom!"
Agora chego aqui e percebo o quão delicioso é ser um "fio-condutor".
ps: Era para falar da mosca? (lol)
Eu li , gostei , mas gostei mais de "vos" dizer isto!
=)
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